Em
uma reportagem especial feita por Eduardo Faustini e André Luiz Azevedo, o
Fantástico mostra como funciona um esquema para fraudar licitações de saúde
pública, feito entre empresas fornecedoras e funcionários públicos.
Com
o conhecimento do diretor e do vice-diretor do hospital pediátrico da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, o repórter Eduardo Faustini fingiu ser
o novo gestor de compras da instituição. Todos os outros funcionários
acreditavam que ele era mesmo o responsável pelo setor de compras, onde pôde
acompanhar livremente todas as negociações e contratações de serviços.
“Todo
comprador de hospital, a princípio, é visto como desonesto. Acaba que essa
associação do fornecedor desonesto com o comprador desonesto acaba lesando os
cofres públicos. E a gente quer mostrar que isso não é assim, em alguns
hospitais não é assim que funciona”, disse Edmilson Migowski, diretor do
hospital.
As negociações foram todas filmadas de três ângulos diferentes e levadas até o último momento antes da liberação do pagamento. Nenhum negócio foi concretizado, nenhum centavo do dinheiro do contribuinte foi gasto.
O
delegado Victor Poubel, titular da delegacia de repressão a crimes financeiros
da Polícia Federal do Rio de Janeiro, informou que vai abrir um inquérito para
investigar a denúncia do Fantástico. Segundo ele, todas as pessoas que aparecem
na reportagem serão intimadas a prestar depoimento e todos os contratos serão
investigados.
A fraude
A fraude
A
lei brasileira prevê que toda empresa que vá fazer um serviço para um hospital
público dispute uma licitação, com outras que oferecem o mesmo serviço. É uma
maneira de tentar garantir que o dinheiro público não vai ser desperdiçado.
No
esquema flagrado pelo Fantástico, no entanto, as empresas fornecedoras se unem
para fraudar a disputa. A que quer ganhar paga uma porcentagem do total do
contrato para as demais -- que entram na concorrência com orçamentos mais
altos. Ou seja, entram para perder.
"Eu
faço isso direto. Tem concorrência que eu nem sei que estou participando,"
comenta a gerente de uma empresa chamada para a licitação de contratação de mão
de obra para jardinagem, limpeza, vigilância e outros serviços, que ganharia R$
5.200.000 se a licitação tivesse existido.
Sem
nenhuma interferência do hospital, o repórter escolheu quatro empresas, que
estão entre os maiores fornecedores do governo federal. Três são investigadas
pelo Ministério Público, por diferentes irregularidades. E, mesmo assim,
receberam juntas meio bilhão de reais só em contratos feitos com verbas
públicas.
Uma
locadora de veículos, foi convidada para a licitação de aluguel de quatro ambulâncias.
“Cinco. Cinco por cento. Quanto você quer?”, pergunta de imediato o gerente.
Falando em um código em que a palavra "camisas" se refere à
porcentagem desviada, ele aumenta a propina. “Dez camisa [sic], então? Dez
camisa?".
O
presidente do conselho da locadora garante que o golpe é seguro e o pagamento é
realizado em dinheiro ou até mesmo em caixas de uísque e vinho. A empresa
ganharia R$ 1.680 milhão pelo contrato. "Eu vou colocar o meu custo, você
vai falar assim: ‘Bota tantos por cento’. A margem, hoje em dia, fica entre 15%
e 20%", explicam o diretor e o gerente de uma empresa convidada para a
licitação de coleta de lixo hospitalar. "Nós temos hoje, aproximadamente,
três mil clientes nessa área de coleta", afirmam.
Para
esconder a fraude da fiscalização, o dinheiro do suborno é espalhado por vários
itens da proposta vencedora. O dono da empresa de jardinagem e vigilância diz à
reportagem que está acostumado a fraudar licitações, e a gerente comenta que o
fraude é "ética de mercado". "No mercado, a gente vive nisso. Eu
falo contigo que eu trago as pessoas corretas. Eu não quero vigarista, não
quero nunca".
Nenhum comentário:
Postar um comentário